8 de ago. de 2014

O que você quer?

Não há vento a favor para quem não sabe aonde vai. Uma estratégia recorrente usada pela maioria dos pais para lidar com o voluntarismo dos filhos é dissuadir a criança, induzindo-a na direção contrária, de forma que a reação da criança em negar o que lhe é sugerido a leve para o caminho certo. Nesse caso os filhos se tornam alvo fácil da estratégia, pois não estão seguros sobre o que desejam e não possuem um arcabouço de conhecimentos e experiências que rivalize com o de seus pais.

Iniciadas as campanhas eleitorais, me sinto como em um show de mágica, olhando para o lado indicado pelo mágico enquanto o truque ocorre atrás da capa. As propostas de governo apresentadas pelos candidatos são absolutamente genéricas, nada dizem de fato sobre o que pretende cada partido, muito menos permitem comparar as diferenças e realizar uma escolha informada. Nas entrevistas e na propaganda eleitoral os candidatos seguem com mais afirmações genéricas (melhorar a educação, fazer o Brasil avançar, acabar com a pobreza, construir soluções) ou ataques aos adversários, e a imprensa limita-se a repercutir os escândalos de seu interesse e reproduzir o discurso pasteurizado dos políticos.

O eleitor acaba por entrar em uma casa de espelhos na esperança de identificar o candidato menos desqualificado, um jogo de luzes e sombras que revela apenas a direção errada e induz a uma convicção infantil de que o outro lado é a salvação. Oculto pelas sombras e expondo à luz apenas a faceta de ser a alternativa ao caos – e os espelhos distorcem e ampliam o caos, com escândalos, insinuações, provas da falha de caráter do adversário – o Candidato passa a ser a única alternativa possível, ocultando suas próprias limitações, na figura de um novo salvador. Se eleito, lutará contra o legado de corrupção e ineficiência criado pela oposição e seus insucessos serão sempre atribuídos a sabotagens ou ao complicado equilíbrio financeiro do mundo moderno. A casa de espelhos nunca aponta as soluções, sempre refletindo e distorcendo os enormes problemas, a onda devastadora que está prestes a te alcançar e que exige que você corra e vote sem titubear, exercendo seu papel de cidadão.

Mas não é assim que deveria funcionar, não podemos determinar nosso voto apenas para afastar quem não queremos, não podemos ser forçados a um "voto utilitário" que visa tão somente colocar na disputa uma pessoa qualquer que tenha mais chances de deslocar do poder a alternativa que nos empurrará para o caos. Ao agirmos assim destituímos o valor da eleição, nosso voto não tem força, é um cheque em branco para aquele candidato que escolhemos não rejeitar. É essa fragilidade do voto que permite que os candidatos não assumam nenhum compromisso, ou que defendam ideias que claramente não irão sustentar depois de eleitos (como a redução do número de ministérios, por exemplo).

Um voto forte é aquele oferecido em troca do compromisso do candidato de defender os interesses do eleitor, de forma que depois de eleito o político tenha uma obrigação a cumprir, sob o risco de não receber mais o apoio do eleitor. Mas isso exige que cada um saiba quais são seus interesses. O que você quer? Esqueça por um minuto os candidatos e os partidos e pense no que você quer para o país, para o estado, para você. Vale a pena investir no combate a miséria? A prioridade para reduzir a violência deve ser a repressão policial ou a transformação social? É possível combinar os dois? O que é mais urgente, uma reforma da previdência, uma reforma tributária, uma reforma educacional? Quais os setores da indústria nacional devem receber maiores incentivos do governo? Qual deve ser a política adotada para o salário mínimo? Que alterações devem ser feitas no nosso sistema político?

Se todos delinearem claramente seus interesses fica mais fácil forçar cada político a se comprometer com uma linha de ação. Enquanto defendermos bandeiras genéricas – o combate à corrupção, o desenvolvimento do país, o equilíbrio econômico, a eficiência do Estado – estamos favorecendo que cada partido apresente ideias genéricas e não precise se comprometer com nenhuma proposta concreta.

Para essas eleições, e certamente para algumas outras que virão, dada a complexidade dos temas, meus interesses incluem:
  1. Prioridade de investimentos para a educação, com metas estabelecidas para elevar o desempenho dos estudantes nas avaliações, aumentar o vencimento dos professores, duplicar em quatro anos o número de estudantes matriculados no nível superior.
  2. Ampliação dos programas de distribuição de renda, como o Bolsa Família, e aceleração do aumento real do salário mínimo.
  3. Criação de um cronograma de redução substancial das barreiras de proteção a indústria nacional, submetendo o setor a uma maior competição internacional. Paralelamente, realização de uma reforma completa da legislação, inclusive no que diz respeito a impostos e taxas, de forma a estimular ao máximo o surgimento de novas empresas e empreendimentos.
  4. Extinção do voto obrigatório e modificação do sistema de eleição de vereadores e deputados de forma a acabar com o efeito tiririca.
  5. Vinculação das alianças partidárias nacionais com as estaduais, de forma que um partido seja obrigado a repetir em todas as unidades da federação as alianças nacionais.
  6. Simplificação do sistema judiciário, reduzindo o número de possibilidade de recursos, estabelecendo prazo máximo de tramitação em cada instância e definindo mecanismos de punição para os tribunais menos eficientes.
  7. Extinção progressiva de todos os benefícios oferecidos a vereadores, deputados e senadores, incluindo recursos para ressarcimento de despesas, cargos de livre nomeação, uso de veículos oficiais, de forma que cada parlamentar receba apenas um salário fixo, com 13º, e tenha direito a nomeação de até dois assessores, cujos salários serão vinculados a sua presença no parlamento, sendo descontados os dias de ausência, mesmo que justificadas, salvo casos previstos na CLT ou na lei 8.112.
Estes são alguns dos meus interesses. E os seus, quais são?